segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Cristologia, textos e leitores. Um diálogo com os colegas

Utilizo esta mensagem para dialogar com Paulo e Júlio. É o diálogo, o trabalho a várias mãos e línguas que produz frutos além do esperado. Daí inquiri-los, perguntar-lhes, dialogar. Sempre há um caldinho a mais para sair.

Júlio e Paulo, cada um a seu modo, reagiram às minhas duas mensagens a partir de ângulos em comum. Os dois olham para o diálogo proposto pelo narrador aos leitores e à palavra final deste. Sim, o leitor, mesmo que leia equivocadamente, sempre terá a última palavra.

Júlio propõe uma leitura velada do segredo messiânico no relato do batizado de Jesus, acessível apenas aos iniciados, àqueles que tem condições de identificar tradições textuais e discursivas complementares, e até contraditórias, que são retrabalhadas pelo autor do evangelho e disponibilizadas por seu narrador.

Diante disso, pergunto, tomando como ponto de partida uma proposição um tanto ingênua, que identifica o evangelho de Marcos como dirigido a gentios, e o de Mateus, por exemplo, a judeus cristãos, em função deste conter muitos textos do AT e, portanto (daí a ingenuidade), poder ser compreendido adequadamente por eles. Volto à pergunta: como trabalhar com essa perspectiva de análise se, como indica Júlio, Marcos contém uma complexa rede de textos do AT retrabalhados? Ou temos que alterar o tipo de imagem dos leitores proposta pela exegese tradicional?

Já Paulo, também trabalhando com questões de tradições, mas em um caminho pouco trilhado, indica práticas de leitura em comum entre autor e leitores do evangelho. Mas as estratégias narrativas visariam, mediante inovações e mesmo escândalos, chamar a atenção dos leitores. Os textos marcanos estariam marcados, então, pelo conhecimento antecipado que autor teria dos destinatários e o texto do evangelho visaria, mediante a surpresa, o escândalo, a mudança de padrões de sentimento, pensamento e comportamento.

Pois bem, diante disso pertunto aos dois: como podemos pensar as práticas de leitura e de interpretação da comunidade primitiva, ou do grupo leitor do evangelho de Marcos?

Parto do princípio de que o evangelho é uma literatura indireta, ou seja, ele é escrito e enviado a um grupo ou grupos de cristãos que o lerão. É provável que o autor tivesse um contato esporádico com os leitores. De qualquer forma, ele provavelmente não estaria presente para esclarecer pontos de controvérsia no texto.

Nesse contexto, outra questão. Visto como no período os textos existiam na forma concreta de rolos de pergaminho principalmente, e estavam localizados nas sinagogas ou casas/comunidades dos cristãos, seriam esses os lugares (públicos) de interpretação? Digo isso por que geralmente temos uma perspectiva anacrônica, pensando que cada cristão possuía sua Bíblia e a lia em casa como fazemos hoje. Bem, sabemos que não era assim. O acesso às escrituras era comunitário nas reuniões da sinagoga - igreja. Portanto, a interpretação também seria coletiva. Certo? Como isso pode interferir nas propostas textuais e dialógicas presentes no evangelho?

Fico por aqui, no aguardo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário