terça-feira, 24 de maio de 2011

A “nova” perspectiva sobre Paulo

Ao mesmo tempo em que o Leonel nos ajuda com os dados “introdutórios” da carta aos Gálatas, deixem-me começar a apresentar o que se costuma chamar de a “nova perspectiva” sobre Paulo.

Para entender a “nova” precisamos, primeiro, saber qual é a “velha” perspectiva. Basicamente a “velha” perspectiva tem três características: (1) os textos de Paulo são lidos a partir da compreensão luterana da “justificação pela fé” como o contrário da justificação pelas obras. Ou seja, nós lemos as cartas de Paulo como se elas fossem cartas de teologia protestante – a justificação pela fé é a “conversão” a Jesus Cristo em resposta à pregação do Evangelho; (2) as “obras da lei” em Paulo são entendidas como sinônimo de “obras”, ou seja, atos morais que realizamos e que nos garantem algum mérito; e (3) a “Lei” é separada das “obras” e é entendida como o contrário da “graça” – a polêmica de Paulo era contra O (com letra maiúscula mesmo) Judaísmo – ou seja, a religião “legalista”.

Então quais são as características da “nova” perspectiva? Respondo fazendo um quiasmo em relação ao parágrafo anterior: (1) o Judaísmo não é mais entendido como “legalista”, no sentido de que a Lei é contrária à graça. O Judaísmo é entendido como “nomismo da aliança”, ou seja, a Lei depende da graça, vem depois da graça e é a resposta do povo de Israel à graça libertadora de Deus. O legalismo é uma distorção do Judaísmo e não o próprio Judaísmo; (2) as “obras da lei” são o cumprimento das “doutrinas” dos grandes ”partidos” religiosos judaicos (fariseus, saduceus, essênios). São a marca principal da identidade do Judaísmo de acordo com esses “partidos”. O que faz um judeu “judeu” é que ele pratica algumas ações que o distinguem dos gentios – ações tais como: circuncisão, guarda do sábado, alimentação pura...; e (3) a justificação pela fé não é o contrário da justificação pelas “obras”; a justificação pela fé é a marca da identidade dos cristãos em contraste com os judeus e com os gentios. É marca de identidade dos primeiros cristãos, não dos “protestantes”. E é exatamente a “justificação pela fé” que se torna o conceito mais em questão na nova perspectiva sobre Paulo – pois não podemos mais identificar justificação pela fé com a identidade protestante ou evangélica.

Tudo isso que escrevi acima você pode encontrar bem explicado e detalhado no livro de James Dunn, publicado pela Academia Cristã: A Nova Perspectiva sobre Paulo.

Há, porém, algo mais a acrescentar que não está no livro de Dunn. Na América Latina a “nova” perspectiva sobre Paulo é, basicamente, política. Veja, por exemplo, a tese de Elsa Tamez: Contra toda condenação; ou o livreto de Gorgulho e Ana Flora Paulo: o Evangelho da Liberdade; ou um artigo que escrevi para a Estudos Bíblicos: “Reescrever a espiritualidade na vida - Uma proposta para a leitura de Romanos 5-8”. Estudos Bíblicos, v.30, p.67-73, 1991. Perspectiva que, no primeiro mundo, é adotada por autores como Neil Elliot: Libertando Paulo; ou Richard Horsley, etc. Na nova perspectiva política, a justificação é a justiça libertadora de Deus, não só para o indivíduo, mas para toda a criação!

Assim, o que nós três desejamos fazer é ler trechos de Gálatas à luz dessa “nova perspectiva”, mas mantendo o projeto do blog: três olhares distintos e complementares: o literário, o semiótico e o da recepção. O resultado, porém, está em aberto ...

2 comentários:

  1. Maravilha de proposta, Júlio! Aguardamos com ansiedade

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  2. Valeu Rodrigo,

    Será importante manter a discussão e contar com a participação de vocês ...

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