segunda-feira, 6 de junho de 2011

Gálatas – uma carta difícil

Difícil por seu conteúdo. Denso, forte, polêmico, beirando uma discussão descontrolada, que outros chamariam, de modo mais direto, de “soltar os cachorros”. Sim, Paulo estava enraivecido com os gálatas. Sobre o conteúdo, deixo para outra mensagem.

Difícil também por sua forma e elementos estruturais. No contexto da epistolografia greco-romana em que as cartas paulinas foram redigidas, há elementos que merecem destaque. Em primeiro lugar, o fato de não haver ação de graças na carta. Fazia parte do gênero e Paulo a utilizava na correspondência com as igrejas. Basta conferir Rm 1.8-15; 1Co 1.4-9; 2Co 3-11; Ef 1.3-14; Cl 1.3-11; 1Tss 1.2-10; 2Tss 1.3-12. Até mesmo para os coríntios Paulo tem palavras de gratidão. Mas para os gálatas não! Essa observação assume maior importância quando sabemos que era costume do apóstolo incluir nas ações de graças os temas que iria desenvolver em suas cartas. No caso da carta aos gálatas, ele opta pela ausência do tópico, por motivos que serão apresentados, dentre eles por resolver retoricamente não adiantar os temas sobre os quais pretendia discorrer.

Outro elemento é a insistência em afirmar que é apóstolo “não da parte de homens” (1.1); que não procura “agradar a homens” (1.10); e que seu evangelho não foi recebido de “homem algum” (1.12); que, ao ouvir o chamado de Cristo, não consultou “carne e sangue” e nem “subiu a Jerusalém aos que já eram apóstolos antes dele” (1.16-17). Tais afirmações transparecem a preocupação de Paulo em manter sua independência em relação a quem quer que fosse, tanto daqueles com quem pretendia disputar, como também para com os líderes e apóstolos que estavam em Jerusalém. Ao mesmo tempo, com a dureza de suas palavras deseja manter intacto seu chamado apostólico, colocando-se em pé de igualdade com os de Jerusalém e com os pseudoapóstolos. Somente como apóstolo Paulo teria autoridade para escrever o que escreveu aos gálatas.

Um aspecto é a repreensão de Pedro por Paulo (2.11-21). Certamente não foi fácil para o apóstolo. Mas como todo homem inteligente e pragmático, ele certamente reconheceu na situação criada pelo abandono da mesa dos gentios por Pedro o momento adequado para fincar posição e demonstrá-la publicamente. Dessa forma, ele pretendia fortalecer não apenas seu ministério entre gentios, mas também dar forças e confiança aos seus seguidores.

Como última observação destaco a abordagem de Paulo ao “evangelho”. Em Gálatas ele não é apenas o “evangelho de Deus”, nem o “evangelho de seu Filho” (Rm 1.1, 9, respectivamente), e tampouco o “evangelho da vossa salvação” (Ef 1.13). Ele é um evangelho que corre o risco de ser desfigurado por outras interpretações. Há o risco de um “outro evangelho” (1.6) que seria uma “perversão do evangelho de Cristo” (1.7). Um evangelho que iria “além daquele que Paulo vinha pregando” (1.8) e que, diante de tal ameaça, recebe a maldição paulina: anátema! (1.8-9). Paulo deixa nas entrelinhas que tal evangelho seria um “evangelho de homens” (1.11).

Os dados acima permitem concluir que Gálatas é uma carta especialmente difícil em seu tom e conteúdo. Procurei, com a identificação de alguns aspectos formais, introduzir essa temática.

2 comentários:

  1. Muito interessante...seu blogger e d+... vou recomendar ele no meu blogger posso?

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  2. Flávio,

    Fique à vontade. E obrigado pela força!

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